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Racismo não é piada: o caso Léo Lins e a urgência de combater o racismo recreativo

  • Foto do escritor: Mapear
    Mapear
  • 6 de jun.
  • 2 min de leitura

Por Luciano Ramos


A recente condenação do humorista Léo Lins por crime de racismo representa um marco importante na luta contra práticas que, por muito tempo, foram naturalizadas em nossa sociedade sob o manto do “humor”. O caso reacende um debate necessário: até quando aceitaremos o uso do riso como forma de violência simbólica e desumanização?


Não é de hoje que Léo Lins faz de grupos vulnerabilizados o alvo principal de suas piadas. Crianças negras com deficiência, pessoas indígenas, mulheres vítimas de violência, moradores do Nordeste — todos foram, em algum momento, alvos de um tipo de comédia que não só fere, mas também reitera desigualdades históricas. Sua defesa, como a de tantos outros, baseia-se no argumento da liberdade de expressão. Mas é preciso afirmar, com toda clareza: não há liberdade de expressão quando ela promove a opressão.


Esse tipo de prática tem nome: racismo recreativo. Um termo cunhado pelo jurista Adilson Moreira para descrever formas de entretenimento que se alimentam do racismo estrutural, mascarando a violência como se fosse apenas uma “brincadeira”. Mas não há nada de inofensivo nisso. O riso que desumaniza não é ingênuo — ele é pedagógico. Ensina, reforça, normaliza. E quem ri junto, muitas vezes, pactua com essa lógica.


A condenação de Léo Lins não é sobre “cancelamento”, tampouco sobre censura. É sobre responsabilização. É sobre mostrar que o direito ao riso termina onde começa o direito à dignidade do outro — especialmente quando esse outro é uma criança negra com deficiência, vítima de múltiplas camadas de exclusão. Quando se ri da dor alheia, perpetua-se uma cultura de violência — não se faz arte.


Não se trata de matar o humor, mas de ressignificá-lo. O humor pode ser uma ferramenta crítica, pode incomodar os poderosos, pode romper silêncios. Mas, para isso, precisa abandonar a covardia de mirar sempre os mesmos alvos: os pobres, os negros, os corpos dissidentes. Não é preciso ser cruel para ser engraçado. E talvez esse seja o maior desafio para uma geração de comediantes que confundiu liberdade com impunidade.


Estamos diante de uma oportunidade histórica. A justiça brasileira, ao responsabilizar um humorista por racismo, sinaliza que o país começa — ainda que timidamente — a reagir. Mas esse é apenas o começo. O combate ao racismo recreativo exige educação, responsabilização, mudança cultural e, sobretudo, escuta ativa das vozes que, historicamente, foram silenciadas em nome do riso.


Porque no Brasil, onde tantas infâncias negras são interrompidas pela violência real, não podemos aceitar que também sejam alvos de violência simbólica nos palcos e nas telas.


Luciano Ramos

Especialista em equidade de gênero, masculinidades, paternidades e antirracismo

 
 
 

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